"Tentativas, erros e acertos" por @anaeazvd

3 DE FEVEREIRO DE 2025

Me chamo Ana Elisa de Azevedo e, atualmente, moro no Rio de Janeiro. Sou designer e fotógrafa, com graduação na escola de belas artes da UFRJ e estou no meio de uma pós sobre design de produtos digitais.

A pintura, a fotografia, o estudo de novas mídias e a atuação na restauração de papel aumentaram o interesse em me aprofundar no estudo de películas fotográficas e dispositivos analógicos.

Comecei tentando entender como funcionava a sensibilidade de filmes vencidos à luz e, ao longo dos anos, comecei a desenvolver um interesse não só por diferentes iluminações e atmosferas, assim como por filmes negativos coloridos (Kodak Ultramax e ColorPlus), preto e branco (ilford HP5), vencidos e de cinema 35mm (Kodak 500T e AeroStill 100).

Eu sei que atualmente todos nós podemos registrar nosso cotidiano através de algum dispositivo de captação de imagem e valorizo muito isso. Inclusive, muito provavelmente estaremos carregando ele conosco diariamente. Eu registro muita coisa com o meu celular. Com o desenvolvimento da fotografia e o aparecimento de novas tecnologias, o encarecimento dos filmes, materiais de revelação e papéis fotográficos, o registro em películas acabou virando um hobby caro e, muitas vezes, incoerente, então entendo o estranhamento.

Estamos trabalhando com máquinas delicadas e complexas, se pararmos pra pensar, algumas câmeras tem 50 - 70 anos. Podemos planejar os resultados, criar uma metodologia, mas nunca prever certamente qual será esse resultado de fato. Acredito que, de certa maneira, exista uma beleza inerente nesse processo. 

Há alguns anos, com o surgimento dos problemas recorrentes da vida pessoal, a fotografia analógica me ajudou a resgatar, com essa característica, um pouco a minha visão subjetiva de mundo. Existe uma certa beleza na expectativa de comprar uma caixinha de filme, de puxar o rolo, colocá-lo na câmera, rodar alavancas. Desvendar a máquina, entende?! Existe um encantamento de se ver aquilo registrado posteriormente, em cores e granulações que já não estamos acostumados a ter naturalmente.

Também acaba havendo uma integração muito interessante entre processos automatizados e processos analógicos, onde existem equipamentos antigos que possibilitam o processo de revelação, softwares de correção de cores e scanners de digitalização de filmes. Hoje você pode revelar um filme, imprimir em Fine Art e digitalizá-lo novamente se quiser. As possibilidades são realmente muito variadas e sinto que, quanto mais estudo as técnicas, mais eu consigo explorar isso. Sinto que há também uma integração entre a “máquina” e essa parte “abstrata e particular” da qual tentamos traduzir e, continuamente, gravar, cada um na sua respectiva proposta, dentro da fotografia.

Lembro de começar registrando muitas coisas das quais naturalmente mexiam comigo: as cenas noturnas, amigos que eu admirava, looks, a rua, e isso possibilitou muitas experiências agregadoras. Há uma correlação muito grande entre os espaços em que eu habito e as coisas que registro. O que se tornou ainda mais latente com a bike, porque me possibilitou explorar novos cantos da cidade. É interessante pensar que todos esses lados se integram. Tanto a fotografia quanto o ciclismo e o design possuem comunidades muito dinâmicas e abertas a trocas, onde tive o privilégio de conhecer e aprender com outras pessoas. 

Acredito que seja subestimada a quantidade de tentativas e erros da qual um fotógrafo precisa se submeter até que consiga calibrar naturalmente todos os elementos para uma boa foto. E quando colocamos isso no registro analógico, essa discussão adquire nuances ainda mais complexas, já que não é possível realizar uma correção ou retoques imediatos.

No exemplo de baixo, temos o mesmo ambiente, fotografado por mim na mesma iluminação, com o mesmo filme dentro da validade, onde ambas as fotos foram tiradas com mesma abertura e tempo e, ainda assim, tive em ambas exposições "problemas” com a captação de imagem no filme e por motivos diferentes. 

É claro, procuramos sempre divulgar o que deu certo, mas por trás disso existe muito estudo. Cada ambiente exige um ajuste, tendo um dispositivo manual ou não, da mesma forma que cada filme possui seu respectivo ISO e, com isso, precisamos estar atentos em relação ao tempo de exposição e abertura.

A cada filme que eu revelo, ou câmera nova, é sempre interessante ter cautela e estar disposta ao fracasso, porque um dispositivo analógico muitas das vezes pode ocasionar num resultado improvável, ainda mais quando não estamos tendo alguma visibilidade ou previsibilidade de como ficará a exposição, o que costuma acontecer com as Point and Shoot, ou famosas “Saboneteiras”. É importante estar preparado para errar, e entender que é a partir desse movimento que conseguimos achar novas soluções e resultados.

É a partir disso que entendemos também que errar é relativo, já que alguns resultados podem vir a serem mais surpreendentes e satisfatórios do que estávamos planejando, tudo vira uma questão de adaptar a sua perspectiva e refletir se vale à pena aquele material ser explorado, sabe?

Por exemplo, no lado esquerdo temos um exemplo de sobreposição de exposições, onde o resultado apresenta nitidez, foco e resolução que não alteram a leitura da imagem; já no lado direito, a sobreposição de imagens com mesmo tom e elementos acaba trazendo um resultado pouco claro.

Além disso, costumo explorar texturas, ângulos, recortes de frames fotográficos em alguns projetos de design pro meu portfólio. 

De certa forma, acredito que a fotografia esteja integrada a muitas partes da minha vida. Eu cresci com álbuns de fotografia analógica dos meus irmãos e meus, que foram tirados pela minha mãe. E sinto que isso acompanha também as pessoas que são próximas de mim, porque sempre faço questão de registrar momentos das nossas vidas analogicamente.

A fotografia me trouxe mais resiliência e humildade para aceitar o processo de determinadas coisas e entender que alguns detalhes podem vir a escapar de mim. Muitas das vezes onde encontro uma dificuldade na bike, eu preciso insistir e entender que são pequenos avanços individuais. Ou quando me frustro com algum protótipo no design e me sinto da mesma forma quando um filme sai em branco.

O estudo de películas e fotografia analógica não é diferente. A gente tá muito acostumado com processos imediatistas, e esquece que o processo é muito mais agregador do que o resultado em si.